A importância de estudarmos essa questão foi destacada por Jesus: “Esta é a vida eterna: que te conheçam, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.” Jo 17.3. Para Ele o correto conhecimento de Deus envolve a salvação da pessoa. Contudo, apesar disto, enfrentamos algumas dificuldades para conhecermos plenamente a Deus.
Em primeiro lugar, existe uma limitação natural inerente a condição humana. Devido a diferença abissal que há entre o homem e Deus, precisamos ter humildade para reconhecer que não podemos saber tudo sobre a divindade.
A tradição conta uma história sobre Santo Agostinho que pode nos ajudar a entender as limitações que temos em entender a natureza tri-una de Deus. O sábio pai da Igreja estava preocupado em compreender como Deus sendo um podia ser três. Para refrescar a cabeça ele resolveu caminhar na praia enquanto refletia sobre o problema. Imerso em seus pensamentos ele só percebeu uma criança brincando na beira do mar quanto já estava bem próxima dela. O menino havia cavado um buraco na areia e com uma canequinha corria para o mar para encher de água salgada. Em seguida ele corria para o buraco para derramar a água nele. Depois reiniciava o processo. Tomado pela curiosidade, o ilustre pensador perguntou ao menino:
“O que você está fazendo?”
“Colocando o mar dentro desse buraco”, respondeu candidamente a criança.
Antes de retrucar que aquilo era impossível, Santo Agostinho se deteve e como se um raio atingisse seu coração entendeu que ele estava fazendo a mesma coisa. Tentar entender Deus em todas as suas dimensões é como querer colocar o oceano dentro de um buraco.
Em segundo lugar, o tema da natureza de Deus não é apresentado de forma explicita nas Escrituras. Se a Bíblia fosse escrita pelos gregos, ela seguiria uma ordem lógica que já estamos acostumados. Em Gênesis, ela começaria a definir quem é Deus, no capítulo seguinte apresentaria seus atributos, para logo discutir os argumentos filosóficos para a Sua existência, e assim por diante. Contudo, não foi assim que ela foi escrita. Como os escritores eram israelitas, eles seguiram a lógica semítica e a forma de pensar típica dos povos orientais. Neste caso, Deus se revelou através da História desse povo. Por ser tão subjetiva para entender essa revelação é preciso analisar todos os aspectos da questão. Se selecionarmos apenas alguns textos isolados, com toda a certeza, cairemos em erro. Seria como observar uma pintura. Se ficarmos muito próximos do quadro, veremos apenas um monte de borrões de diversas cores. Para apreciar a sua beleza precisamos dar alguns passos para trás e ver obra toda. Da mesma forma somente um estudo que aborde todos os textos que falem do tema poderá nos capacitar para entender o tema.
Quando perdemos essa capacidade de ver o todo, o objeto de nosso estudo bíblico vai parecer que se contradiz em muitos pontos. Por isso, encontrar uma resposta que harmonize todos os ângulos da questão não é uma tarefa fácil.
Em terceiro lugar, existe uma tendência natural no coração humano para aceitar o erro e evitar a verdade. Somos pecadores, e o pecado influencia a nossa forma de pensar e afeta o nosso entendimento. É por isso que a palavra profética nos adverte que nos últimos dias surgiriam muitos falsos profetas, que teriam muitos seguidores (Mt 24.11; At 20.29, 30; 1Tm 4.1,2; Jd 17-19).
Sobre este perigo Ellen White nos adverte:
“Nestes últimos dias, surgirão falsos mestres que se tornarão ativamente zelosos. Serão apresentados todos os tipos de teorias para desviar a mente de homens e mulheres da própria verdade que define a posição que podemos ocupar com segurança neste tempo em que Satanás está operando com poder nos pregadores, induzindo-os a ter a pretensão de ser justos, deixando de colocar-se, porém, sob a orientação do Espírito Santo.
“Falsas teorias serão mescladas com todos os aspectos da experiência, e defendidos com ardor satânico, para cativar a mente de toda alma que não está arraigada e firmada no pleno conhecimento dos sagrados princípios da Palavra. Entre nós mesmos surgirão falsos mestres, dando atenção a espíritos enganadores cujas doutrinas são de origem satânica. Esses mestres arrastarão discípulos atrás deles. Insinuando-se sorrateiramente, usarão de palavras lisonjeiras e farão hábeis deturpações com enganosa habilidade.
“A única esperança de nossas igrejas é manterem-se bem despertas. Os que estão bem firmados na verdade da Palavra, os que provam tudo por um ‘Assim diz o Senhor’, estão seguros. O Espírito Santo guiará os que prezam a sabedoria de Deus acima dos enganosos sofismas de instrumentos satânicos.” 99MM 125.
Por isso, guando se levanta alguém ensinando algo que é contrário ao que está escrito, encontra vários seguidores. Nessa onda várias almas sinceras acabam se perdendo, seduzidos pelo erro. Depois que a pessoa duvida apenas de algum ponto da fé que cria ela abre a porta para outros erros e assim ela acaba crendo em coisas que um dia achou absurdo. Os grupos que se tem levantado contra a Trindade, procuram atacar essa verdade pelo ponto menos conhecido pelo crente comum, a pessoa do Espírito Santo. Eles não questionam a divindade de Cristo por que esse ponto é muito mais estudado e conhecido pelo crente comum. Mesmo que ele não seja capaz de apresentar provas conclusivas, o cristão médio pode apresentar alguns pontos difíceis de serem refutados pelo que não crê na Triunidade divina. É uma estratégia de guerra. Se os muros de uma cidade estão muito fortificados em um ponto, então deve-se atacar os pontos menos vigiados. Infelizmente, e para grande prejuízo da igreja cristã, a doutrina do Espírito Santo tem sido pouco estudada aos longos dos séculos. Por se conhecer tão pouco sobre Ele, os hereges miram sua artilharia contra esse aspecto da doutrina da Trindade. Eles sabem que depois que a pessoa descrê da personalidade do Espírito Santo, ela estará pronta para aceitar a idéia de que Cristo não é Deus, ou pelo menos que Ele não é eterno como o Pai.
Contudo o processo de desestruturação doutrinária continua. O próximo ponto a ruir é a crença no dom profético manifestado no ministério de Ellen G. White. Acontece que o que ela escreveu sobre a divindade é tão contundente que não há como manter a veracidade da sua obra se não se aceita a doutrina da Trindade.
A partir desse ponto a alma pode tomar vários caminhos. Temos visto alguns seguirem o caminho da descrença, ao ponto de duvidar da integridade do texto bíblico. Alguns chegam a duvidar que o evangelho de Mateus é canônico ou acham que a Bíblia foi adulterada. Outros podem radicalizar o seu monoteísmo e acabam judaizando a sua fé. Assim, começam a ensinar que a única forma de cultuar a Deus é seguindo os ritos cultuais judaicos, ou seja, adotando-se a cultura judaica. Para esses Jesus é uma palavra pagã e a forma correta do nome do Salvador é Yehoshua. Contaram-me que alguém que seguiu essa senda, quando recebe visita de pessoas que comungam da sua incredulidade pergunta: “Qual é a novidade?” O coração humano é assim. Se conhecêssemos mais a nós mesmos desconfiaríamos mais de nossa capacidade de entender a verdade e desconfiaríamos mais do erro.
Por outro lado se aceitarmos a doutrina da deidade de Cristo, a fé na doutrina da personalidade do Espírito Santo e da Trindade virão juntas. Como veremos nas próximas páginas, a divindade de Cristo é clara nas Escrituras e foi discutida ao longo da história da igreja. É um tema estudado a exaustão e por isso muito difícil de contestar. Por não haver nenhuma novidade nos argumentos apresentados, não é difícil defendê-la. Como dissemos, a questão da personalidade do Espírito Santo é um tema muito menos estudo. Podemos perceber isso quando se consulta uma obra sobre teologia sistemática. Depois de várias páginas provando a divindade de Cristo os autores dedicam poucos parágrafos a pessoa do Espírito Santo, isso quando nem discutem o tema da Pneumatologia (a doutrina do Espírito Santo).
A plena divindade de Cristo pressupõe a Trindade. Quando alguém nega a Trindade deve apequenar a divindade de Cristo. Por isso, eles não aceitam a eternidade dEle, o que torna um deus menor ou subordinado, mas não Deus pleno. Existem diferentes graus de negação da deidade de Cristo. Há aqueles que preferem apenas negar a Sua eternidade. Outros afirmam que Ele não é Deus ou que Ele usa o título apenas pela vontade de Deus e não para descrever a Sua natureza intrínseca e nata.
O assunto exige atenção até por aqueles que crêem nessa doutrina. Muitos cristãos bem intencionados tentam explicar a doutrina da Trindade fazendo analogia com fatos e coisas terrenas e acabam caindo no erro do triteísmo. Quando falamos de forma tão distinta sobre a função de cada um dos membros da divindade podemos transparecer que cremos em três deuses. Por isso, evite explicar a Trindade com analogias. Podemos falar de três pessoas mas não de três indivíduos.
Talvez o leitor mais criterioso se questione por que usamos a palavra Trindade neste livro? Afinal, ao falar do Pai, Filho e Espírito Santo seria melhor usar a palavra triunidade e não Trindade. Triunidade enfatiza a unidade, ao mesmo tempo que destaca que há três pessoas na divindade enquanto a palavra Trindade fala de três pessoas, sem destacar a unidade dentro da divindade. Outra razão que as pessoas apresentam para rejeitar o uso dessa palavra é a idéia de que Igreja Católica detém o direito autoral para o seu uso. Como nenhum protestante quer ser acusado de papista é fácil criar uma certa rejeição a nomenclaturas que estão associadas a este sistema. Contudo, não foi a igreja Católica que criou o nome e muito menos a doutrina, como veremos nas próximas páginas.
Mesmo que esta palavra não seja encontrada na Bíblia, é um termo corrente entre os cristãos. Para os estudiosos da Bíblia esta palavra define posições, sem precisar maiores esclarecimentos. Por estes motivos, usamos esse termo ao longo desse trabalho e não vimos razão para a sua rejeição.
Uma última palavra de esclarecimento aos nossos leitores: Ellen White adverte-nos contra as especulações sobre a pessoa de Deus e, por extensão, sobre o Espírito Santo. A moldura histórica que envolveu esses conselhos foi a crise panteísta que o Movimento Adventista enfrentou a mais de cem anos atrás. Note que ela não está proibindo o seu estudo, mas sim as especulações filosóficas que vão além do que está escrito.
“Não é essencial que sejamos capazes de definir exatamente o que seja o Espírito Santo. Cristo nos diz que o Espírito é o Consolador, o ‘Espírito de verdade, que procede do Pai’. Jo 15.26. Declara-se positivamente, a respeito do Espírito Santo, que, em Sua obra de guiar os homens em toda a verdade ‘não falará de Si mesmo’. Jo 16.13.
“A natureza do Espírito Santo é um mistério. Os homens não a podem explicar, porque o Senhor não lho revelou. Com fantasiosos pontos de vista, podem-se reunir passagens da Escritura e dar-lhes um significado humano; mas a aceitação desses pontos de vista não fortalecerá a igreja. Com relação a tais mistérios - demasiado profundos para o entendimento humano - o silêncio é ouro. AA 51, 52.